Ele escuta, mas não etende!
- Laís
- 21 de mar. de 2018
- 5 min de leitura

Daniel é uma criança alegre, viva, curiosa e faladora. Seu segundo nome é Samir que significa "companheiro falante". Isso define ele com bastante precisão!
Uma criança que alcançou todos os marcos de desenvolvimentos esperados para a idade dele, sentar.. andar.. falar... até que entrou na escolinha e começou a primeira observação: O Dani não se interessa por atividades como massinha e pintura. Ok, normal.. cada criança tem seu tempo. O que se sucedeu a partir dai foram inúmeras mudanças de escolinhas (por causa de nosso processo de estruturação familiar) e em cada uma delas novas observações: Dani não corre, não pula, não faz as atividades propostas...
4 anos e meio e lá fomos nos para pediatra -> Neuro -> oftalmo -> otorrino... aquele mapeamento padrão que inclusive contou com um "diagnóstico" precipitado e duvidoso de TOD (transtorno opositor desafiador) por parte da Neuro que tinha acabado de conhecê-lo e que inclusive sugeriu medicação, assim na lata! Claro que eu com o bom senso que Deus preservou em mim não aceitei e partimos para uma avaliação neuropsicológica. Essa avaliação custou bastante caro e ao final um laudo impreciso que não constatou nada "fechado" apenas desafios e ajustes na dinâmica familiar, em outras palavras: o problema segundo o avaliador estava na educação que Daniel estava recebendo, falta de atenção, disciplina e tudo isso ai que já sabemos.
Menos mal... a questão "estava em mim", mãe, então eu me esforcei muito.. mudei toda a minha vida e até me encorajei a finalmente pedir demissão para seguir meu antigo sonho de me dedicar ao lar, ter mais filhos etc. No final tudo isso foi bom! Acontece que as queixas da escola não pararam nunca e sempre era uma nova coisa e quando chegou a fase de alfabetização ele começou a se distanciar MUITO do que era "esperado" para a idade dele. De repente apareceu uma gagueira, a maturidade da linguagem nunca veio e ele ficou permanentemente fixado em falar "pincesa", "quiança", "panta" (sempre nos encontros consonantais com R e L) e uma insegurança e auto estima lá no chão que passou a prejudicar ele em todas as esferas da vida dele. Ele estava resistente até mesmo a tentar fazer algo, pois já se sentia frustrado e fracassado. Isso me trouxe muita angustia e na época eu decidi tirar ele da escola particular que frequentava onde era exigido muito dos alunos e passei ele para uma escola pública apenas para questões legais e mandava ele 1 a 2x por semana e comecei a trabalhar com ele em casa a alfabetização. Foi então que comprei um curso do Prof. Carlos Nadalim chamado "Ensine seus filhos a ler", onde ensina a alfabetização pelo método fônico que raramente é praticado nas escolas hoje em dia. Foi quando enfim ele começou a entender como ler as letras e escrever... foi um processo lento que exigiu de mim algo que eu nem sabia que seria capaz de oferecer, pois não tenho formação alguma na área da educação. Mas conseguimos progressos!
No ano seguinte eu engravidei e decidi voltar ele para uma escola particular, onde ele iria cursar a terceira série. Novas e constantes queixas de falta de atenção, atraso... todas ligadas ao processo de aprendizagem, raramente de comportamento. E eu sempre notando que ele tem uma inteligência preservada, super capaz, com um diálogo super articulado. Nas ocasiões em que estudávamos para as provas ele saberia responder a todas as questões oralmente. Mas ao transformar isso em palavras escritas a nota era zero. Repetiu de ano.
Na segunda vez que cursou a terceira série ele se saiu bem melhor, pois já estava vendo tudo pela segunda vez, mas jamais pararam de me alertar que algo não estava bem e que ele permanecia com o tal do baixo rendimento escolar. Eu mesma percebia. Não andava de bicicleta, nem mesmo conseguia dar laço no cadarço.... cada criança tem seu tempo, mas quando fica tão discrepante não há como não saber no fundo do coração que algo esta fora do lugar.
Percorri de novo o caminho com novas especialidades inclusas: pediatra -> Neuro -> oftalmo -> otorrino -> geneticista .... e com isso muitos exames: ressonância de crânio, eletroencefalograma, Exames de sangue (dezenas de itens ), exame genético de cariótipo, avaliação neuropsicológica e exames de audiometria e PAC (processamento auditivo central). Foi um período muito puxado, indo pra cima e pra baixo com a Ananda no sling junto conosco nessa saga, mas eu estava determinada a descobrir o que era esse "algo" fora do lugar, o que quer que fosse.
Todos os exames estavam dentro da normalidade, inclusive o de audiometria, audição perfeita. Mas no exame de PAC (Processamento auditivo central) o diagnóstico veio. Daniel tem muitas alterações no processamento auditivo, sobretudo no lado esquerdo uma condição chamada DPAC, distúrbio do processamento auditivo central. Não pretendo aqui fazer uma descrição exata, mas basicamente ele faz com que Daniel não consiga ter a correta compreensão do que ele escuta. Ele escuta bem, mas dentro do cérebro dele a informação se perde no percusso entre a audição e a compreensão. Ele escuta, mas não entende. E isso é o grande responsável por todas as dificuldades pedagógicas que ele teve todos esses anos, assim como também é responsável pelas dificuldades de fala e inclusive explica as questões motoras, pois esta tudo interligado.
A noticia boa? Não é uma doença e sim uma condição tratável com terapia fonoaudiológica! Terapia essa que já começamos e estamos todos os dias trabalhando aqui para resolver essa questão e permitir que ele se desenvolva plenamente!!
A avaliação neuropsicológica foi também de fundamental importância, pois foi avaliado toda a parte cognitiva e comportamental do Daniel e pudemos excluir outras comorbidades como autismo etc. Ele apresenta uma dislexia e um transtorno de déficit de atenção (sem hiperatividade), mas são condições ligadas ao DPAC que provavelmente serão superadas ao longo das terapias. Vamos buscar auxílio de uma Terapeuta Ocupacional também para trabalhar as questões da psicomotricidade.
Fora isso... uma inteligência um pouco acima da média para a idade dele, vocabulário e desenvoltura para se comunicar excelentes e boa relação interpessoal.
Graças a Deus e a minha disposição de ir até o fim para ajudá-lo, enfim sabemos como trabalhar ESPECIFICAMENTE e INDIVIDUALMENTE com ele, para que ele possa superar seus desafios e pontos fracos. Eu acredito 100% no Dani, nem preciso dizer né?
Eu ainda sigo buscando entender melhor todas essas questões e os impactos que tem na vida dele e como isso afeta seu desenvolvimento pedagógico e social, mas sinto que já dei grandes passos e que agora será mais fácil cumprir minha grande missão de ajudá-lo a potencializar a sua potência. Todos temos limitações temporárias e desafios, a dele é essa!
Quem quiser mais informações ou conversar sobre o assunto, estou à disposição.
:)